Por: Paula Freire
(colaboradora do Memórias...e outras coisas...)
“Eu achava que religião não era para garantir o céu,
depois da morte,
mas para tornar esse mundo melhor,
enquanto estamos vivos”
- Rubem Alves -
Se existem momentos na vida das sociedades, que pressuponham a existência de Deus, esta época será um deles.
Chegados a esta altura do ano, imagino sempre, inevitavelmente, o que Deus quererá dizer-nos quando os homens afirmam o convite que Ele, um dia, nos dirigiu no sentido de olharmos e venerarmos a exaltação do Criador que ofereceu o Filho em sacrifício pelos nossos pecados (São João 3:16, Porque Deus amou de tal modo o mundo que lhe deu o Seu Filho único, para que todo o que n’Ele crer não pereça, mas tenha a vida eterna).
A reflexão, a humildade, o recolhimento, a procura efetiva sobre o sentido de existência… por onde andam? Acreditar-me-ei cega de fé porque não os vejo no meio de tamanha turbulência de festas e iluminações antecipadas?
Escreveu, certa vez, Marie von Ebner-Eschenbach, que “haveria muito menos mal no mundo, se o mal não pudesse ser feito sob a aparência do bem”. Sinto-me levada a concordar com cada letra da escritora.
Nada melhor do que esta quadra para confirmar como a relação tida com as palavras é tão diferente da relação tida com as ações.
A realidade espiritual adorna-se de rituais pouco vividos e ainda menos sentidos.
Os dias transformados em mais uma passagem que desgasta e satura. O encolher de ombros, a indiferença, a sensação aborrecida do dever cumprido, o cansaço da partilha fingida, a passividade na intenção de oferecer o que se possa ter de melhor. Talvez porque, lá dentro, residam somente sombras e névoas que impedem de ver outra luz que não seja a que se julga luz própria.
No fundo, um tempo e lugar estranhos onde do amor muito pouco se experimenta.
A bem de ver, presépios, palhinhas, manjedouras, cordeirinhos, não fazem milagres. O milagre acontece quando o fazemos acontecer, por nós e, muitas vezes também, em nós. O milagre acontece quando celebramos a fé que nos impele a caminhada, a esperança de tornar melhores os instantes simples, a ousadia de tocar o outro e por ele fazer a diferença num ato que poderá parecer insignificante mas que, apesar do pouco, se torna sublime.
Para quando abrir a alma a uma relação de intimidade connosco mesmos? Com frontalidade, sem o coração posto num protagonismo descabido e que muito pouco alimenta o que existe de verdadeiro bem no interior do peito?
Interessarmo-nos, verdadeiramente, mais por nós do que por aquilo em que desejamos encaixar-nos para mostrarmos aos outros um suposto ‘eu’ convencionado?
Perceber que nesta órbita onde queremos tanto acreditar não existirem impossíveis, só a consciência do quanto somos limitados, pode permitir-nos alcançar esse ponto de felicidade pelo qual tão desesperadamente ansiamos.
Sentimentos puros e autênticos: os únicos que podem e merecem ser oferecidos em nome de Deus, os únicos que nos podem transformar num presente exclusivo.
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