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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 3 de julho de 2023

Um Episódio dos Bailaricos do Pó na Cabeça

Por: António Pires 
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Desde que me conheço, fui assaltado pela dúvida sobre a razão da minha predisposição/inclinação (não diria jeito), qual traço comportamental que me define, para a dança, como acto social de expressão de sentimentos. Duas teorias são possíveis: ou, noutra vida, fui africano e, como tal, a música, por natureza, está-me no sangue; ou porque não degenero, enquanto filho de Balfrades, conhecidos por bailarotes.
Desde muito cedo comecei nestas andanças.  Nos finais da década de 70 e durante a seguinte, era frequentador assíduo (como se fosse a minha religião) dos bailes das aldeias (com as “pistas de dança” em terra batida, que provocavam enormes nuvens de pó), num raio de “actuação” que compreendia os concelhos de Bragança, Vimioso e Miranda do Douro. Dancei muito, num tempo em que os conjuntos musicais (o Baco, o Midnes, o Melotrup, o Suspense, o Diapasão, o Tribo Nordeste, o Vector e outros que tais), ao contrário do que se passa hoje, começavam a montar o palco (atrelados dos tractores) e a afinar os instrumentos às 3 da tarde, para iniciarem a actuação por volta das 6 horas, prolongando-se os arreais até às 3/4 da manhã. Ao contrário de hoje, os músicos de então, iam jantar a casa dos mordomos. 
Teria eu os meus 18/19 anos, acompanhado da minha “seita” (o meu falecido irmão Mário, o João Pinheiro e o Chico Granada, o cómico dos cómicos), rumámos à festa de Babe - que se realiza sempre no Dia do Corpo de Deus, Maio ou Junho - , dentro do mítico Volkswagen Brasília, de cor amarela, dos meus pais – o primeiro daquela marca a circular em Bragança. Chegados à aldeia, com o bailarico a começar, dirigimo-nos ao baile e, à distância, o meu amigo Filipe Lobo, viola solo e vocalista, mal me “abistou”, como era hábito fazê-lo, dedicou-me a lindíssima e romântica música “A Rosinha dos Limões”.
Acabada a música, um senhor de Babe, que eu não conhecia, abeirou-se de mim e perguntou-me:
- Você é filho do Sr. Manuel Pires, que trabalha na Câmara?
Com natural e justificado orgulho, respondi:
- Sim, sou filho dele. 
Confirmação que, depois do meu improvável interlocutor ter relevado os valores morais do meu progenitor, me valeu o convite, cujo “não” me parecia fora de hipótese: 
- Olhe que quero que vá jantar a minha casa!
Dei, naturalmente, a resposta normal duma pessoa de bom – senso:
- Agradeço-lhe imenso a gentiliza do seu convite, mas não vou poder ir, porque venho com mais três pessoas.
Uma resposta que para o anfitrião (ou p´ra qualquer transmontano dos quatro costados) não era suficientemente atendível:
- Não, meu amigo! Nem pense nisso! Vão todos lá jantar comigo, porque onde cabe um, cabem quatro!
“Deribado” a não ter coragem de recusar, o prazenteiro senhor comunicou-nos que, quando o conjunto acabasse de tocar, nos iria buscar ao recinto do baile. À hora marcada, qual Chico da Nora que, na encruzilhada, esperava a Maria, o bem – intencionado senhor, por qualquer motivo que nunca saberemos, não chegou a aparecer, e já lá vão mais de 40 anos.
Conclusão: fomos à única tasca da aldeia e comemos um dos maiores manjares que alguém pode desejar: pão, sardinhas picantes em lata, presunto, cebola e uma binhaça directamente da pipa, que pedia meças a uma qualquer grande reserva Duas Quintas ou Valpradinhos.
A partir desse memorável dia, tive consciência de três coisa: só não há solução p´rá morte;  não se deve comer cebola, querendo, a seguir, dançar slow; e não existe nada melhor do que um bailarico de pó na cabeça, para quem, como eu, viveu intensamente as décadas de 70/80.

António Pires


António Pires
, natural de Vale de Frades/S. Joanico, Vimioso.
Residente em Bragança.
Liceu Nacional de Bragança, FLUP, DRAPN.

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