Em pouco mais de dois meses, a delegação passou de “zero para 90 voluntários” entre os estudantes do Instituto Politécnico de Bragança (IPB), 20 dos quais são portugueses e os restantes estrangeiros das diferentes nacionalidades que representam um terço dos nove mil alunos do ensino superior.
O presidente da delegação da Cruz Vermelha (CV), Duarte Soares, destaca “a revolução com a chegada destes jovens” que o próprio foi procurar ao IPB.
A juventude deste médico conhecido pelo trabalho na área dos cuidados paliativos, que assumiu a direção da CV em dezembro, não será alheia à atenção que lhe despertou o “potencial adormecido que havia no politécnico muito forte para o voluntariado”.
“Não tínhamos uma instituição que aproveitasse esse potencial. Bragança é uma cidade que tem uma instituição cheia de juventude”, observou à Lusa, contando que fez uma reunião, em dezembro, com a direção do politécnico.
A diligência deu resultado e os jovens têm aparecido com o conhecimento técnico dos diferentes cursos, desde ciências biomédicas, enfermagem, educação social.
Alguns dos jovens levam também as próprias necessidades, chegam à Cruz Vermelha porque precisam e acabam por ficar para ajudar outros.
É o caso de Carla, de São Tomé e Príncipe, que aos 21 anos frequenta a licenciatura em Educação Social, já foi beneficiária e agora é voluntária.
Os bens materiais ajudam, mas foi também o "apoio de conforto" que ali encontrou que a fez ficar e olhar para as necessidades dos outros.
“Há pessoas que parecem tristes e a gente não liga, as pessoas deviam prestar mais atenção, a pessoa está a precisar de um ombro amigo”, alertou.
Carla já é “quase coordenadora” de um loja social que estão a criar com produtos de diferentes origens, que é difícil encontrarem na cidade, e que será também um espaço de tertúlia e “uma loja de inclusão”, como realçou Emília Oliveira, que aos 30 anos coordena o voluntariado na delegação.
Emília já trabalha na Cruz Vermelha há alguns anos e nota a diferença dos últimos meses com a chegada do novo voluntariado.
“Mudou a carga de trabalho, a motivação, o espírito, a entreajuda, discutem entre eles e criam soluções”, concretizou.
A brasileira Samara chegou em dezembro, é beneficiária e “das voluntárias mais dedicadas”, como constata a direção.
A experiência adquirida já lhe permitiu arranjar trabalho a cuidar de uma pessoa, que articula com os estudos.
Trabalho certo tem já João, o jovem enfermeiro que continuará a integrar as brigadas covid da Cruz Vermelha, que já fizeram “três mil quilómetros num mês” a testar população e escolas.
A instituição tem também um posto fixo de testes e várias respostas sociais, desde protocolos com juntas de freguesia para levar cuidados de saúde ou alimentação às aldeias, o programa operacional de apoio aos carenciados e o combate à solidão dos mais vulneráveis durante a pandemia, em parceria com entidades locais, algumas das quais disponibilizam verbas, outras produtos ou serviços.
A crise pandémica trouxe outros pedidos de ajuda como ferramentas de trabalho, concretamente computadores ou bicicletas para fazer entregas ao domicílio.
A voluntária Miriam, de Angola, está agora a pensar em ações sobre alimentação saudável durante o confinamento.
A delegação passa a ser também responsável pelo novo centro de acolhimento de migrantes, em parceria com a congregação das Servas Franciscanas Reparadoras de Jesus Sacramentado, que recebe, na sexta-feira, os primeiros três refugiados.
Outra nova resposta é direcionada para a comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero), que encontra na Cruz Vermelha um espaço de apoio e encaminhamento.
A delegação tem quase “meio milhar de beneficiários, 200 dos quais nos programas alimentares”, como indicou o presidente.
Teresa, uma estudante de Baião em Bragança, confessa que quando chegou à delegação de Bragança “foi uma surpresa”.
“Não sabia que englobava assim tanta coisa, pensei que era só ajuda aos mais necessitados”, partilhou.
E as necessidades tanto podem ser de bens, como de cuidados ou de mimos como as massagens terapêuticas da Joana durante os apoios domiciliários ou a concertina da Margarida, que leva para animar os utentes das aldeias.
Silvania faz domicílios e já foi a algumas aldeias, onde, garante, “as pessoas ficam maravilhadas” com o trabalho destes voluntários.
“É voluntário, mas recebe-se sim: a reação das pessoas. Não há melhor que sentir que está a fazer uma boa ação”, diz.
Também para Carla “o pagamento disso é ver a melhoria do outro, ver o outro feliz, principalmente os idosos sozinhos, sem ninguém para conversar”.
“Na conversa, nota-se que eles sentem-se aliviados”, observou.
Dois jovens estudantes, Julhas e Majeda, chegaram há pouco tempo do Bangladesh e são dos mais recentes beneficiários e frequentadores da delegação.
Souberam da Cruz Vermelha por um amigo. Dizem-se agradecidos por se terem juntado ao projeto.
A forma de entreajuda que ali encontraram é diferente do país de origem, como diferente é Portugal.
“Se as pessoas dizem que este país é pobre, eu digo que vão ao meu país ver como é. Vocês vivem como reis e rainhas”, diz Julhas.
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