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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 30 de outubro de 2021

O que procurar no Outono: o azereiro

 São muitas as espécies de árvores selvagens que se encontram em risco de extinção. Segundo o relatório publicado recentemente pelo Botanic Gardens Conservation International (BGCI), uma em cada três espécies de árvores está em perigo.


Das 58.497 espécies de árvores do mundo, 30% estão em risco de desaparecer. São cerca de 17.000 espécies de árvores em declínio referenciadas na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

O mesmo estudo revela que, das cerca de 17,5 mil árvores em risco, mais de metade das espécies são endémicas, e que mais de 440 espécies estão mesmo à beira da extinção, o que significa que restam poucos espécimes de cada uma na natureza (menos de 50 exemplares). Outras 142 árvores já foram dadas como extintas.

Da totalidade das espécies de árvores existentes, o estudo revela que apenas 41,5% estão confirmadas como seguras. Entre as espécies ameaçadas estão magnólias, carvalhos, bordos, sorveiras, ébanos e camélias.

Em Portugal, das pouco mais de 100 espécies de árvores nativas existentes no território nacional, oito estão sob ameaça, sendo o azereiro (Prunus lusitanica) uma das espécies que causa maior preocupação.

Foto: Javier martin/Wiki Commons

O azereiro é sem dúvida uma das mais belas árvores da nossa floresta e é muito gratificante quando percorremos uma mata e o encontramos ali mesmo, com as suas folhas verde-escuras brilhantes a contrastar com o branco das suas flores, na primavera, ou com o negro dos seus frutos, no outono.

Azereiro

O azereiro, também vulgarmente conhecido como loureiro-de-Portugal ou ginjeira-brava, é uma espécie da família Rosaceae.

É uma pequena árvore que pode crescer até aos 10 metros de altura, por vezes chegando até aos 20 metros (quando cultivado). 

O tronco apresenta uma casca acinzentada, quase lisa.

As folhas são simples, persistentes, de coloração verde-escura, lustrosas e coriáceas. São mais ou menos pendentes e possuem uma forma lanceolada e pecíolo vermelho-escuro.

A floração ocorre na primavera, entre finais de abril e junho. As flores são brancas, hermafroditas, sem cheiro, reunidas em inflorescências alongadas, sob um pedúnculo sem folhas, com 30 a 80, raramente 100 flores brancas por cacho.

Foto: A. Barra/Wiki Commons

O fruto é uma pequena cereja (drupa) com um formato ovóide a subgloboso, verde na fase inicial de formação, passando por cores como o laranja, vermelho, púrpura e, finalmente, o preto lustroso quando amadurece no final do verão ou início do outono.

Espécie lusitana

Etimologicamente, a designação científica desta espécie está relacionada com a sua origem geográfica. O nome do género Prunus é o nome em latim dado à ameixa selvagem, do grego prune, cuja origem se perdeu com o tempo. O restritivo específico lusitanica deriva do latim lustianicus-a-um, de Lusitânia, origem geográfica da espécie – a província romana no oeste da Península Ibérica, ocupada atualmente por Portugal.

O azereiro é uma espécie relíquia da floresta Laurissilva, que sobreviveu à última glaciação na Europa, encontrando-se a sua área natural muito restrita. É uma espécie nativa de Portugal, das ilhas da Madeira, Açores e Canárias, Espanha, França e Marrocos.

Foto: Javier martin/Wiki Commons

Em Portugal são três as subespécies que podemos encontrar: a Prunus lusitanica subsp. lusitanica é nativa de Portugal Continental e pode ser vista nas regiões da Beira Baixa, Beira Litoral, Minho e Trás-os-Montes. A sua maior população natural está concentrada na Mata da Margaraça.

A subsp. azorica, vulgarmente conhecida como ginjeira-brava-dos-açores ou ginja-do-mato, é uma espécie endémica do Arquipélago dos Açores, quase extinta na natureza. Ocorre nas Ilhas de São Miguel, São Jorge, Pico, Terceira, Faial e Flores, onde só se conhece um exemplar.

A subsp. hixa é vulgarmente conhecida como ginjeira ou ginjeira-brava e é uma espécie endémica da Macaronésia, existindo apenas na Ilha da Madeira e nas Canárias.

O azereiro tem preferência por ambientes húmidos e sombrios, podendo formar azereirais ou azevedos ao longo das linhas de água. Também pode constituir bosques ripícolas e surgir em carvalhais.

Edaficamente, esta espécie cresce em qualquer tipo de substrato, preferindo solos siliciosos e ácidos, húmidos, férteis e bem drenados.

É uma árvore tolerante ao frio, a solos básicos e, uma vez bem estabelecida, também à seca. É muito resistente à contaminação atmosférica e ao vento, podendo até suportar o vento marítimo, devido à folhagem firme e coriácea que possui.

Valor ecológico e paisagístico

De ocorrência rara na natureza, o azereiro é muito interessante a nível ecológico e ornamental.

Do ponto de vista ecológico, possui uma elevada capacidade de adaptação ao meio, difícil de encontrar noutras espécies, nomeadamente espécies exóticas, e possui um papel fundamental ao nível das alterações climáticas, pela sua resistência ao frio, à seca, à contaminação e à alcalinidade dos solos. Alguns autores apontam-nos como uma presença essencial na criação de pequenos microclimas, favorecendo as condições ecológicas dos locais onde se desenvolvem.

O azereiro também tem um papel importante na alimentação das aves. Os seus frutos são muito apreciados, após a maturação, por algumas aves que os consomem, ao mesmo tempo que ajudam na disseminação das suas sementes.

Já para os humanos, a ingestão dos frutos não é aconselhável. Apesar de serem comestíveis (crus ou cozinhados), contêm compostos glicosídeos cianogénicos (amigdalina e prunasina) que, por hidrólise, produzem cianeto de hidrogénio – o que lhes dá um sabor e cheiro inconfundível a “amêndoa amarga” e confere toxicidade para os humanos. Se forem consumidos em excesso podem provocar paragem respiratória e até a morte. No entanto, o consumo em doses muito reduzidas pode melhorar a digestão, estimular a respiração e proporcionar um certo bem-estar.

Do ponto de vista medicinal, o azereiro é apontado como emético, bactericida e fungicida. Existem registos etnobotânicos da utilização da sua casca, como antipalúdico, e no tratamento de picadas de víboras ou de cobras, em gado. Outros estudos apontam para a sua aplicação como embelezador e protetor da pele e como indutor da permeabilidade cutânea.

Foto: Javier martin/Wiki Commons

A beleza natural desta árvore, das suas folhas, flores e frutos, confere-lhe um valor paisagístico muito relevante. No entanto, em Portugal, onde existem as maiores populações naturais e selvagens desta espécie, não é muito comum a sua utilização como árvore ornamental.

Para quem gosta da flora nativa, o azereiro é uma espécie apropriada para jardins e outros espaços verdes, pelas suas flores atraentes e especialmente pela sua folhagem agradável, nomeadamente como indivíduo isolado ou em pequenos grupos e até em sebes ou topiária – uso para o qual o azereiro possui grande apetência.

A sua madeira é resistente, apresenta um tom rosado, e tem sido usada em pequenos trabalhos de marcenaria e no fabrico de pequenos utensílios de cozinha, flautas e bengalas.

 Quase Ameaçada ou Em Perigo  

Segundo a lista vermelha da Flora Vascular de Portugal Continental e da IUCN, o azereiro consta da lista de espécies com a avaliação de “Quase Ameaçada”. Estima-se que em Portugal Continental as populações nativas desta espécie estejam a decrescer e gravemente fragmentadas, verificando-se também um declínio contínuo de indivíduos maduros.

Do ponto de vista de avaliação global (mundial) da IUCN, o azereiro (Prunus lusitanica subsp. lusitanica) e a ginjeira-brava-dos-açores (Prunus lusitanica subsp. azorica) constam da lista de espécies “Em Perigo”.

Os dados atualmente disponíveis apontam para populações muito reduzidas – entre 100 a 200 indivíduos – da ginjeira-brava-dos-açores, o que levou as autoridades europeias a integrá-la no Anexo II da Diretiva Habitats. Esta é a Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, que engloba as espécies animais e vegetais de interesse comunitário cuja conservação exige a designação de zonas especiais de conservação.

Já a ginjeira-brava (Prunus lusitanica subsp. hixa), subespécie nativa do Arquipélago da Madeira, está classificada como espécie “Vulnerável”, segundo a IUCN.

A redução de populações desta e de outras espécies, para além de reduzir a biodiversidade, afeta a renovação de oxigénio e altera ecossistemas. As árvores são o “escudo protetor” dos ecossistemas, fundamentais na proteção de outras espécies vegetais, animais e até do Homem. 

Proteger as árvores vai muito para além de proteger somente algumas espécies, mas todas as espécies. É urgente agir para mudar de paradigma e evitar o colapso.

Dicionário informal do mundo vegetal:
Coriácea – que tem uma textura semelhante à casca da castanha ou do couro.
Hermafrodita – flor que possui órgãos reprodutores femininos (carpelos) e masculinos (estames).
Inflorescência – forma com as flores estão agrupadas numa planta.
Pedúnculo – “Pé” que sustenta a inflorescência.

Carine Azevedo

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