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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 20 de agosto de 2022

O que procurar no Verão: o lúpulo

 O lúpulo (Humulus lupulus), que está em flor de Junho a Setembro, é uma planta espontânea trepadeira de elevada importância económica, que passa completamente despercebida na natureza. Muitas vezes é desprezada e vista simplesmente como um erva que, quando bem desenvolvida, se enrola sobre outras plantas.

Lúpulo. Foto: Luc. T/WikiCommons

O que a maioria das pessoas talvez desconheça é o papel fundamental desta planta na produção de cerveja. Embora não tenha a fama do malte nem a notoriedade da cevada, as flores femininas de lúpulo conferem-lhe o aroma e amargor para além de terem um papel importante na formação da espuma e na prevenção da deterioração da bebida.

O lúpulo também possui múltiplas capacidades terapêuticas sendo, desde a antiguidade, utilizada na medicina tradicional. Nos últimos anos, as suas propriedades terapêuticas têm sido valorizadas na prevenção e tratamento do cancro.  

Vamos conhecer esta planta que tanto dá mais sabor à vida como faz bem à saúde.

O lúpulo

O lúpulo pertence à família Cannabaceae, a que pertencem pouco mais de uma centena de espécies, distribuídas por nove géneros botânicos.

Os membros economicamente mais importantes desta família são o cânhamo (Cannabis sativa) e o lúpulo (Humulus lupulus). O lodão-bastardo (Celtis australis), uma árvore ornamental nativa de Portugal, muito comum em parques e jardins, é também um membro importante desta família botânica.

A família Cannabaceae tem ampla distribuição em quase todo o mundo. Muitas das espécies ocorrem nas regiões tropicais e subtropicais, embora muitas outras ocorram também nas regiões temperadas.

O lúpulo, também conhecido como engatadeira, erva-engatadeira, lúpulo-trepador, pé-de-galo, vinha-do-norte, lúparo, é uma planta herbácea, vivaz e rizomatosa.

Esta planta, embora seja muitas vezes considerada trepadeira, não possui gavinhas ou qualquer outro apêndice para esse fim. É formada por caules volúveis, que podem atingir cinco metros de altura, raramente até dez metros, formados por vilosidades rígidas que favorecem o enrolamento da planta sobre qualquer tipo de suporte que lhe sirva de tutor. Curiosamente, cresce enrolando-se sempre no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio.

As folhas são na sua maioria opostas, embora nas extremidades dos ramos possam ser alternas. São pecioladas e cordiformes – em forma de coração – mas também podem ser ovadas e palmadas.

A maioria das folhas são recortadas em três, cinco ou sete lóbulos profundos, ovado-lanceolados, acuminados e com margens dentadas, sendo o central maior que os laterais. Nas extremidades dos raminhos as folhas podem ser inteiras.

A página superior é verde e áspera ao toque, pelo menos nas margens, devido à presença de numerosos pêlos. A página inferior é pubescente e glandulosa. 

Junto à base do pecíolo, forma duas estípulas membranáceas, lanceoladas e bífidas. As estípulas desenvolvem-se antes das folhas, formando uma cobertura protetora para estas. Quando as folhas se formam por completo, as estípulas murcham e desaparecem.

O lúpulo é uma espécie dióica, com flores masculinas e femininas, unissexuais e esverdeadas, em indivíduos separados.

Lúpulo. Foto: C. T. Johansson/WikiCommons

As plantas masculinas e femininas só se conseguem distinguir na época de floração, que ocorre entre junho e setembro, já que não existe outra característica morfológica que permita a sua distinção.

As flores masculinas, de cor verde-amarelada ou esbranquiçada, surgem reunidas em panículas axilares, pendentes, envolvidas por brácteas membranáceas, e cada uma é formada por cinco tépalas fundidas na base e cinco estames.

As flores femininas, de cor verde-amarelada ou creme, são perfumadas, exalam uma fragrância semelhante a resina do pinheiro e surgem numa inflorescência muito compacta, semelhante a um cone, em grupos de vinte a sessenta flores. As inflorescências são geralmente solitárias ou formam pequenos grupos e são conhecidas como “ouriços” e parecem-se com pequenas pinhas com consistência de papel.

O fruto é um aquénio globoso, mais ou menos séssil, coberto por numerosas glândulas aromáticas amareladas.

O lúpulo pode viver de 10 a 20 anos. A parte aérea desta planta desaparece no inverno, mantendo o rizoma subterrâneo ativo. Na primavera seguinte inicia um novo ciclo de formação de longos caules, folhas, flores e frutos.

Distribuição geográfica e habitat

O lúpulo é uma espécie nativa de grande parte da Europa, centro da Ásia e norte de África. Em Portugal ocorre nas regiões do norte e centro e também no litoral alentejano. Não há registo da sua presença nos arquipélagos da Madeira e dos Açores.

Esta planta prefere locais de exposição solar plena ou com sombra parcial, ambientes frescos, solos férteis e bem drenados, sendo muito comum na margem dos cursos de água, em bosques ripícolas e em silvados.

O lúpulo, quando bem estabelecido, é tolerante a temperaturas até -15ºC, no período de dormência, e também pode resistir a longos períodos de seca. No entanto, é sensível ao vento forte.

Foto: João Domingues Almeida/FloraOn

A polinização desta planta é anemófila, ou seja, dá-se pela ação do vento que transporta o pólen das plantas com flores masculinas para as plantas com flores femininas.

Esta planta é uma importante fonte de alimento e de refúgio para muitas larvas e lagartas de borboletas e traças. A borboleta-coma (Polygonia c-album), a “Currant Pug” (Eupithecia assimilata), a “Buttoned Snout” (Hypena rostralis) e a borboleta-pavão (Nymphalis io) são alguns dos exemplos de lepidópteros, que vivem e se alimentam de folhas, flores e frutos de lúpulo.

As flores de lúpulo libertam um aroma agradável que atrai as abelhas.

Uma planta com efeito ornamental peculiar

A origem do nome do género Humulus não é de consenso geral.

Alguns autores consideram que o nome Humulus é de origem escandinava e que deriva dos termos humle ou humal, ou de origem eslava = chmele. Outros apontam que terá origem alemã = humela ou humela, enquanto outros autores consideram que Humulus deriva de hommel, palavra utilizada na Flandres ocidental.

No entanto, a versão mais bem acolhida é a de que o termo Humulus deriva do termo em latim Humus, embora existam duas vertentes: os que consideram que o nome indica “terra rica em substâncias orgânicas = húmus”, em referência à preferência desta planta por solos húmidos profundos e ricos em matéria orgânica, ou porque quando não encontra apoio ou suporte para se enrolar, cresce sobre o solo, rastejando.

O epíteto específico lupulus é o diminutivo de lupus = lobo, aludindo ao facto desta planta possuir caules volúveis que trepam e se agarram a outras plantas, envolvendo-as e estrangulando-as como um lobo faz a um carneiro.

Foto: André Carapeto/FloraOn

O lúpulo possui um efeito ornamental muito interessante. A bonita folhagem e os cones femininos muito decorativos são preponderantes para a escolha desta planta em muitos projetos paisagísticos, embora ainda seja pouco comum essa utilização em Portugal.

O lúpulo é perfeito em jardins de casas de campo ou jardins mediterrânicos. É uma planta de rápido crescimento com uma grande facilidade de trepar, ideal para crescer sobre pérgolas, paredes ou cercas, sendo útil para o revestimento de estruturas inestéticas.

A combinação desta planta com as roseiras trepadoras “criam” latadas muito decorativas e cheias de cores e aromas. O lúpulo também pode ser usado em sebes, para a criação de divisórias naturais, em jardins de maiores dimensões.

Trepadeira versátil

O lúpulo é utilizado na cozinha, na medicina tradicional, na cosmética, bem como na indústria cervejeira.

Na cozinha, os rebentos de lúpulo são colhidos e preparados como os espargos e as folhas jovens. As pontas dos rebentos e as flores masculinas são misturados em saladas e sopas. Os extratos e óleos essenciais são usados para aromatizar bebidas não alcoólicas, sobremesas geladas, bombons, gelatinas, pudins e outros doces cozinhados.

A utilização do lúpulo na medicina tradicional é já muito antiga. Possui diversas propriedades terapêuticas, tais como: antioxidante, sedativa, laxante, antimicrobiana, antisséptica, antiespasmódica, diurética, antibiótica e antifebril.

As inflorescências femininas contêm lupulino, que atua como um excelente tranquilizante, sendo tradicionalmente usadas nos travesseiros para garantir uma boa noite de descanso. Ao lupulino também são atribuídas propriedades anafrodisíacas.

O lúpulo também é usado no tratamento de doenças nervosas, ansiedade, e insónias. Pode ajudar a combater nevralgias, falta de apetite, dores de estômago, desconforto intestinal, tosse e pode ajudar a controlar a febre.

Foto: Francisco Clamote/FloraOn

Estudos recentes confirmam que possui também propriedades anticancerígenas, que contribuem para a prevenção e tratamento do cancro da pele, da mama, do colo do útero e do ovário.

O contacto da planta com a pele pode causar dermatites e erupções cutâneas e os pêlos podem irritar os olhos, sendo por isso necessário muito cuidado ao manipulá-la. Deve sempre consultar um profissional de saúde antes de utilizar esta planta para fins medicinais.

Na cosmética, os extratos são utilizados para obter cremes e loções que ajudam a amaciar a pele, a aliviar a caspa dos cabelos e para banhos de relaxamento. O lúpulo também faz parte da composição de alguns produtos naturais, desenvolvidos especificamente para aumentar os seios das mulheres.

As fibras dos caules são usadas no fabrico de cestos e artigos de vime e na indústria têxtil, para produzir um pano grosseiro. Os óleos essenciais são um dos ingredientes de alguns perfumes e são também utilizados na indústria do tabaco, como aromatizante.

O lúpulo e a cerveja

Desde a Idade Média que se utilizam plantas para aromatizar e preservar bebidas fermentadas.

E embora não tenha a fama do malte nem a notoriedade da cevada, o lúpulo faz parte da composição e do processo de fabricação da cerveja.

As flores femininas de lúpulo são formadas por glândulas de lupulina que contêm resinas e óleos essenciais que são utilizados no processo de fabrico desta bebida, conferindo-lhe um sabor amargo e aromas peculiares próprios, juntamente com outras propriedades indispensáveis para a qualidade da cerveja.

Os aromas dependem da variedade de lúpulo utilizada. Hoje em dia, são inúmeras as variedades comerciais obtidas a partir da planta silvestre que podemos facilmente encontrar em condições naturais. As notas aromáticas obtidas podem ser florais, cítricas, ervais ou frutadas e são o resultado da harmonia sensorial de inúmeras substâncias aromáticas encontradas na planta e nos seus óleos essenciais. 

O lúpulo contém substâncias que inibem a proliferação de bactérias na cerveja, funcionando como um “conservante natural”, evitando a deterioração da bebida, prolongando a vida da cerveja. Também é rico em substâncias antioxidantes e possui uma ação antisséptica.

A formação e estabilidade da espuma da cerveja também está ligada à presença dos compostos amargos do lúpulo, já que os óleos essenciais assim como outros compostos influenciam o paladar e o corpo da bebida, dando a sensação de preenchimento da boca, quando a bebemos. 

Da próxima vez que pedirem uma cerveja, já podem explicar aos vossos amigos a importância deste ingrediente “secreto” no seu sabor. E, não se esqueçam: bebam com moderação.

Dicionário informal do mundo vegetal:

Trepadeira – planta que trepa e se desenvolvem ao longo de estruturas ou de outras plantas vizinhas.
Herbácea – planta de consistência não lenhosa e verde.
Vivaz – planta que vive mais do que dois anos, renovando anualmente a parte aérea.
Rizomatosa – planta cujo caule é subterrâneo – rizoma – que cresce geralmente na horizontal, com aspeto de raiz, composto de escamas e gemas, como se de um caule aéreo se tratasse.
Gavinha – estrutura filamentosa, resultante da transformação da extremidade dos ramos, que tem a faculdade de se enrolar em hélice, através da qual as plantas se conseguem fixar a suportes.
Volúvel – caule que se enrola em hélice sobre um suporte, característico das plantas trepadeiras.
Vilosidades – pêlos longos, macios, direitos ou sinuosos, não muito densos, que ajudam a planta a apoiar-se sobre um suporte à medida que se desenvolve.
Oposta – diz-se de folhas que se inserem lado a lado e ao mesmo nível (no mesmo nó).
Alterna – diz-se de folhas que se dispõem sucessivamente ao longo de um eixo, mas só uma de cada vez e em cada nó. 
Peciolada – provida de pecíolo – “pé” da folha que liga o limbo ao caule.
Palmada – folha com a forma de uma mão com os dedos abertos.
Lóbulo – parte da folha com recorte pouco acentuado.
Ovado-lanceolada – folha com base atenuada e à medida que chega ao ápice vai ficando com forma oval.
Acuminada – folha cuja ponta é geralmente aguda e mais estreita que a restante parte e com os lados ligeiramente côncavos.
Pubescente – que tem pelos finos e densos.
Glandulosa – possui glândulas.
Estípula – estrutura semelhante a uma pequena folha, que se encontra na base do pecíolo, geralmente aos pares, uma de cada lado.
Bífida – dividida em duas partes mais ou menos até ao meio.
Dióica – espécie que apresenta flores unissexuadas, femininas e masculinas, ocorrendo em indivíduos diferentes.
Unissexual – flor que possui apenas órgãos reprodutores femininos ou masculinos.
Panícula – Inflorescência em cacho ou em espiga.
Bráctea – folha modificada, localizada na base da flor que a protege enquanto está fechada.
Tépala – peça floral não diferenciada em pétala ou sépala.
Estame – órgão reprodutor masculino da flor, onde se produz o pólen.
Inflorescência – forma com as flores estão agrupadas numa planta.
Cone – órgão reprodutor (tipo de pseudofruto), geralmente de forma cónica, composto por escamas, que se sobrepõem parcialmente ao longo de um eixo central, e que protegem as sementes.
Aquénio – fruto seco, indeiscente e monospérmico.
Séssil – que se insere diretamente pela base, sem pecíolo ou pedicelo.
Latada – estrutura sustentada por postes e com arames em altura e na horizontal, na qual as plantas trepadeiras se apoiam e se desenvolvem, estendendo os seus ramos formando uma cobertura natural.

Carine Azevedo

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