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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

A INGRATIDÃO DOS FILHOS

Por: Humberto Pinho da Silva 
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Resguardada do ardor da tarde sob frondoso castanheiro, na cercania de carriça transmontana, a velhinha fia.
Tem o rosto sulcado pela goiva do tempo. Olhos apagados, lábios finos, boca desdentada, e tez crestada, da cor de centeio. 
Fia; e o fuso: gira...gira...gira... pressionado pelos descarnados dedos.
Foi moça fagueira; esbelta, de farta cabeleira calamistrada e viçosa face da cor de nácar.
Casou… Foi mãe.
Criou filhos, que abalaram...
Todos partiram: uns, para o Céu; outros, em demanda de vida melhor...
Ficou; mergulhada em saudade e cuidados de quem a deixou.
De tempo a tempo, telefonam, escrevem...
Prometem interná-la num lar...
Daqueles que guardam pais e mães, que deixaram de serem prestáveis.
Cuidou dos filhos com esmero: ajudou-os a darem os primeiros passos; a comerem; à mesa; aparou-lhes a baba viscosa, que escorregava do beiço; enxugou-lhes o húmido nariz; branqueou-lhes a roupa enegrecida pela traquinice; passou horas de angústia à cabeceira do berço...
Os meninos eram tudo, e tudo era para eles.
Agora, é a mãe que carece de mão amiga: quem a ampare; quem cuide; quem lhe lave a veste enodoada; quem lhe apare as unhas endurecidas; quem a desvele com carinho.
Para que nada lhe falte.
Mas os filhos não têm disponibilidade...
Olvidam, que chegou o tempo de retribuírem; esquecem-se de pagarem - os cuidados, os carinhos que receberam...
Meditando, a velhinha fia.
E o fuso: gira...gira..gira...
Pelos desgastados olhos, desenrolam-se cenas amorosas, recreações pueris, que a memória guardou, com amor.
Agora só Deus permanece...
Só Ele ficou...
Os gerados pelas suas entranhas esquecem-se, que: a felicidade, o diploma, a riqueza que gozam, é fruto daquela velhinha, que junto ao carriço, arrimada ao secular castanheiro: fia... fia... fia...
Zagaziantes lágrimas de saudade, docemente escorem pela face encarquilhada:
-" Coitados! Têm muito que fazer...A culpa é das mulheres... trabalham muito. Como gostava de estar na companhia deles!…” 
Leve sorriso amoroso, alastra-lhe pelo rosto tisnado...
E o fuso: fia...fia...fia... 

Humberto Pinho da Silva
nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA. Foi redactor do jornal: “NG”. e é o coordenador do Blogue luso-brasileiro "PAZ".

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