Henrique Fernandes é gaiteiro e palheteiro, ou seja, um construtor de palhetas para gaitas de fole que trabalha em Sendim, em Miranda do Douro, dedicando-se a construir estas pequenas peças feitas a partir de cana, para alcançar um degerminado som debitado pela gaita de fole, ao gosto de cada gaiteiro. Por este motivo é importante ter conhecimentos, uma técnica apurada, mãos habilidosas, um sopro forte e um ouvido sensível.
Estes tempos de pandemia, provocada pelo novo coronavírus, levaram o palheteiro do Planalto Mirandesa, que manufatura palhetas "únicas" que são utilizados por "muitos" gaiteiros de vários pontos do país e de Espanha, a desenvolver técnicas e equipamentos utilizadas no fabrico das mesmas para proteção contra a covid-19.
"Tive de reajustar-me e adaptar-me à construção das palhetas. Há todo um processo de construção destes elementos que me obrigou, em determinadas fazes do fabrico, tais como o corte e medidas das matérias-primas, a utilizar uma mistura de lixívia e álcool para a desinfestação dos manteriais utilizados, como o metal, a cana e o fio, para que ficassem devidamente limpos", explicou à Lusa o artesão.
Henrique Fernandes adianta que todo trabalho manual é feito utilizando dois pares de luvas de látex em cada mão, para não perder a sensibilidade e manter a máxima higiene possível durante o fabrico desta peça tão sensível para as gaitas de fole.
Contudo, outros desafios se colocaram ao artesão, como o processo de calibragem das palhetas para a afinação do seu timbre, em que é utilizados um "soprete" com um manómetro, para indicar pressão certa e havia que colocar a boca neste aparelho.
"Com este equipamento visualizava a pressão que o ponteiro da gaita de fole exercia sobre a palheta para haver um equilibro sonoro. Inicialmente, usei um sistema de sopro indireto com um pequeno filtro que passava para esse soprete e cheguei à conclusão de que era rudimentar", concluiu Henrique Fernandes.
Como a necessidade aguça o engenho, o artesão depressa descobriu outra forma de contornar o obstáculo e "inventou" uma espécie de "aparelho" para medir a pressão nas palhetas, com recurso a uma bomba para encher pneus da bicicletas, e resultou.
"Como temos uma alavanca que faz pressão que depois é direcionada para o sítio onde encaixa a palheta no ponteiro de sopro, ou no 'palhão' da ronco da gaita de fole, ficam as medidas certas e deixo de fazer sopro direto pera esta peça", explicou à Lusa o artesão.
No campo das vendas de palhetas, as encomendas reduziram muito porque foram cancelados muitos eventos culturais onde a gaita de fole era presença obrigatória, como feiras medievais ou arruadas pelas localidades em tempo de festas populares.
"Com estes cancelamentos, tem havido pouca procura de palhetas. Esperamos que melhores tempos venham", afiançou o gaiteiro e artesão.
Por seu lado, Célio Pires, um dos construtores de gaitas de fole mais requisitados do Nordeste Transmontano, também tomou medidas de contenção relativas à propagação da covid-19.
"Entrego sempre a gaitas de fole na rua com as devidas distâncias recomendadas e limpo as gaitas [de fole] com um produto desinfetante. Depois, cada tocador sabe os procedimentos que tem de fazer", explicou o artesão e instrumentista
No campo das encomendas, desde os meados de março que o construtor deixou de ter pedidos para a construção de novas gaitas de fole. As que foram feitas antes, os seus futuros tocadores pedem tempo paras as poderem levantar e pagar.
"Até ao início desta pandemia ainda tive cerca de 25 gaitas encomendadas, o que é bom. Agora pedem-me para aguentar um pouco, até haver eventos culturais e que sejam injetados alguns subsídios para estes músicos podem adqurir os seus instrumentos. Também há clientes que estão em vários pontos do país que aguardam o fim do confinamento para poder levantar os seus instrumentos ", disse Célio Pires.
Foto: FP
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