«Aos 8 de Maio de 1762, pelas sette horas e meia da tarde, tempo em que todo este reino de Portugal estava bloqueado em roda pelas armas hespanholas, esta provincia invadida, e cercada esta cidade por um exercito de 30 mil homens, estando a atirar a artilheria do Castello e Rebolins ao sobredito exercito inimigo, logo que descarregou um canhão mais contiguo á torre grande, passados quatro ou cinco minutos, arrebentou o armazem da polvora, arruinando quasi todo o castello, e fazendo duas brexas exteriores, uma para a parte do norte, por onde bem cabião onze homens, e outra para a do meio-dia, em correspondencia, por onde cabiáo nove, arruinando tambem a melhor parte do castello para o oriente, que entrava para a cidade, e metade da torre grande, dando em terra com todo o edificio e officinas que dentro delle havia, em cujas ruinas falleceo muita gente, que a mais della se não pode averiguar quem era, por se acharem queimados do fogo que se alimentou com mais de mil e quinhentas arrobas de polvora.
Desta gente que pereceo, muitos erão soldados, outros paizanos e ordenanças da terra, que andavão trabalhando dentro do mesmo castello em menesteres que se lhe mandavão, e outras pessoas da cidade.
Não pude alcançar ao certo o numero de gente; mas averiguado por prudentes, e feita a diligencia e inquirição possivel, me parece fallecerião 350 a 400 pessoas, assim no castello e suburbios, como pelas ruas da cidade; e para memoria mandei escrever esta declaração, que, com a lista das pessoas que abaixo vão carregadas, assignei.
E não vão os nomes e patrias com mais individuação, porque o não pude saber. E tambem declaro que debaixo da brecha que faz cara ao meio dia, estão mais de cem pessoas, que as vi sepultar na ruina, porque cazualmente me achava presente, e quiz Deos livrar-me.
Desta gente que pereceo, muitos erão soldados, outros paizanos e ordenanças da terra, que andavão trabalhando dentro do mesmo castello em menesteres que se lhe mandavão, e outras pessoas da cidade.
Não pude alcançar ao certo o numero de gente; mas averiguado por prudentes, e feita a diligencia e inquirição possivel, me parece fallecerião 350 a 400 pessoas, assim no castello e suburbios, como pelas ruas da cidade; e para memoria mandei escrever esta declaração, que, com a lista das pessoas que abaixo vão carregadas, assignei.
E não vão os nomes e patrias com mais individuação, porque o não pude saber. E tambem declaro que debaixo da brecha que faz cara ao meio dia, estão mais de cem pessoas, que as vi sepultar na ruina, porque cazualmente me achava presente, e quiz Deos livrar-me.
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(46) Como este documento embora já divulgado na imprensa e a primeira vez na obra de José Avelino de Almeida, nunca o foi na íntegra, por lhe faltar a lista das vítimas da lúgubre tragédia, aqui o reproduzimos completamente.
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Dentro do doujão, ao redor do poço, está tambem muita gente. Na ponta do terreiro, caminhando para a plataforma, junto ao castello, ficarão tambem muitos sepultados. Na cortinha contigua á peça desbocada, que é do Josefa Simões, se enterrarão 70 e tantas pessoas, que nenhum se soube quem era, e com trabalho se podérão tirar das ruinas.
Encheo-se quasi todo o cemiterio da Sé, e dentro da Sé se supultarão os que couberão, cujos nomes, conforme pude alcançar, como dito tenho, são os seguintes:
Pe. Jose Luiz de Lucena, natural de Viana arcebispado de Braga e secretario de Sua Ex.cia Rd.ma
Pe. João Rodrigues natural da Batalha clerigo in minoribus cujos pais ignoro.
Manuel Antonio e Francisco filhos que ficarão de João de Sousa e de sua mulher Maria Pires desta cidade de Miranda.
Antonia Pella solteira natural de Campo de Viboras.
Rafael Rodrigues Galego solteiro filho natural de Anna Maria Ayres.
José filho de Manuel Fernandes e de sua mulher Manuela Ribeira de menor idade.
Dois meninos do Boleilhos.
O homem de hua Treza de Vinhaes com duas filhas tambem.
Dois meninos de Jorge Carcereiro.
Manuel Antonio e Anna Josefa filhos de Antonio de Moraes Pena juiz da alfandega e de sua mulher Mariana Thereza desta cidade.
Maria Jose creada de Antonio de Moraes Pousa filha da Colona e pai não sei o nome, desta cidade de Miranda.
João Pedro Bruno filho de Bruno (...) e de sua mulher Thereza Pascale.
Tres soldados que estavão de quartel em caza de Manuel Fernandes de Aragão cujos nomes ignoro.
Ricardo Jose e Lionarda irmãos filhos de Manoel Alves e de sua mulher Caetana de Sousa.
Anna Affonsa solteira natural de Val da Porca de maior idade.
Jose de Moraes filho de Luzia de Moraes (...) de menor idade.
Jose Gonçalves Pedreiro casado com Thereza Campilhas.
João Pedro filho de Xavier da Costa e de sua mulher Francisca da Silva.
Manuel Pires carpinteiro cazado com Maria Malhadas.
Luiz Pereira casado com Anna Sardenta.
Agostinho Vieira cazado com Agueda Fernandes.
Jeronymo Canedo filho de José Canedo e de sua mulher Agueda Fernandes.
Ignacia Garcia filha de Francisco Garcia e de sua mulher Anna Rodrigues.
Luiza Caetana da Silva e sua filha Eugenia de menor idade mulher de João Manoel da Mata.
Francisco Xavier Martins cazado com Ignocencia Pires.
Pedro filho de Antonio Jose e de sua mulher Thereza Martins Paredes de menor idade.
Jose Manuel filho de Jose Manuel Moreira e de Maria Teixeira da villa do Vimioso.
Jose filho de Jose Machado e de sua mulher Maria Ramos de villa da Bemposta.
Catherina Fernandes e hum filho chamado João mulher de Sebastião Ferreira.
Jose Caetano Feo casado com Mariana Cordeira.
Jose de Sousa viuvo que ficara de Luiza do Rego.
Mariana filha de Francisco Alves e de sua mulher Anna Vaz.
Miguel Martins Ferreira cazado com Luzia Sebastiana.
Manuel Lopes de Duas Igrejas morador nesta cidade casado com Mariana Vidal.
O sego de Palancar chamado Manoel filho de Manuel Martins Lastras e hum criado.
O alferes da Ordenança chamado Gomes.
Francisco Rodrigues pay do Pe. cura de Duas Igrejas.
O capitam de Garnadeiros Antonio Cardozo da Fontoura de Paradella de Mascarenhas.
O tenente de Garnadeiros Francisco Gomes de Bragança.
O capitam Francisco Luiz de Moraes natural de Fradizella e he de Infanteria.
O alferes Andre Rodrigues Faria natural da villa de Chaves.
O sargento da Infantaria Francisco José Ferras casado em Bragança com Maria Ignacia.
O sirurgião do regimento Manuel de Moraes natural de Villarinho da Castanheira.
Manoel Rodrigues Chaves comissario de (...) e natural da villa de Chaves.
O cabo de esquadra Manoel Caetano Charro natural de Bragança.
Mathias Gonçalves e hum filho natural de Cercio.
O ferreiro de Villar Seco que lhe não sei o nome.
Ignez Galega viuva natural de Travanca e moradora nesta cidade.
Manoel Gonçalves tambor Ignacia Affonso sua mulher e hua filha.
Antonio Alves casado com Eufemea da Torre.
Clara Ribeira viuva de Jose Rodrigues Patallas.
Mariana Ribeira cazada com Diogo Moreno Castelhano e hua filha de menor idade.
Manoel Antonio filho de Antonio Moreno.
Micaella Martins mulher de Antonio Nunes Rebres e hüa menina de menor idade.
Guiomar filha de Domingos Pires Monelo.
Genobeba filha de Manoel Rodrigues Castellãos e de sua mulher Manoella Rodrigues.
Anna Curralla mulher de Jose Moreira.
João filho de Balthezar Pires e de sua molher Justa Vedal.
Maria Fernandes molher de Antonio Fernandes natural de Aldea Nova forneira do regimento favaceiro mor.
Mariana criada de Manoel de Sousa natural de Sam Pedro da Silva.
Bento Mendes soldado de cavallo natural de Calveche.
Sebastiam dos Santos soldado de cavallo natural do Mogadouro.
Manoel Lopes soldado infante cazado ccm Maria Rebella.
Manoel Amaro filho de Antonio Rodrigues Amado.
Antonio filho de Felix Miguel e de sua molher Izabel Garnacha.
Agostinho filho de Antonio de Moraes e de sua molher Joanna Maria.
Antonio Rodrigues Potra viuvo de Maria Jose.
Sebastiam Luiz cazado com Maria Lopes.
Andre Gonçalves cazado com Maria Gomes e seo filho Manoel Costodio.
Manoel Pereira cazado com Antonia Lopes.
Jose Manoel filho de João da Silva e de sua molher Luzia Casqueira.
Antonio filho de Jose Martins e de sua molher Anna Martins moradores nesta cidade.
Manoel Machado solteiro de Duas Igrejas creado de Jose de Almeida.
Pedro Domingues de Val da Porca filho de outro era soldado e de Anna Cepeda.
Felix Dias solteiro filho de Antonio Dias e de sua molher Maria Rodrigues do lugar de Sandim.
Jose Maria soldado natural do lugar de Salsellas.
Jose Malrrasco cazado com Thereza Maria do mesmo lugar.
Manuel Malrrasco cazado com hüa fulana pobre do mesmo Sendim.
Manoel Gabriel Cardozo cazado com Maria Pardalla do mesmo Sendim.
José Cardozo alfaiate cazado com Maria Pardalla do mesmo Sendim.
Jose de Moraes solteiro soldado filho [de] Ilario de Moraes de Val da Madre.
Francisco menor filho de Manoel Cepeda e de Maria Garcia taverneiros desta cidade.
Manoel Andre artilheiro casado na cidade de Bragança.
Ignacio Caldeira cazado artilheiro da cidade de Bragança.
E um artilheiro que ignoro o nome cazado no lugar de Val de Lamas.
E um pedreiro piqueno do Minho.
Declaro tambem que a maior parte delles forão soccorridos com a absolvição que por mim e outros sacerdotes lhes foi dada, e muitos tambem com a extra unção; e alguns que vierão acabar de morrer dentro da Sé, e no hospital, com o Sanctissimo; e geralmente no mesmo instante levárão todos a absolvição. Bento de Moraes Freyre [Era o parocho ao tempo de Miranda do Douro]».
Em nota à margem lê-se o seguinte: «no dia 9 depois de duas horas tomou posse da cidade o exercito hespanhol» (47).
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(47) Livro dos Óbitos de Miranda do Douro referente a 1762, fl. 198.
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MEMÓRIAS ARQUEOLÓGICO-HISTÓRICAS DO DISTRITO DE BRAGANÇA
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