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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

A VELHA AMARRADA AO BURRO

Por: Humberto Pinho da Silva
(colaborador do "Memórias...e outras coisas..."

Acontecia, outrora, aos médicos da província, cada uma, que nem ao mais levado mafarrico lembrava.
Fernando Namora, narra, com a graça que lhe era peculiar, as suas aventuras, em: “ Retalhos da Vida de um Médico”.
E muitas pitorescas e engraçadas historietas, se contam, desses humildes “ João Semanas”: - verdadeiros heróis, que alcançavam “ milagres” com os escassos recursos que dispunham.
Ora, havia nesse tempo, jovem médico, com consultório montado no centro da cidade de Bragança, considerado e respeitado, por todos os brigantinos.
Suas curas, espampanantes, espalharam-se por todo o distrito, desde Bragança até a terras de Miranda, porque não havia maleita, que não sarasse, nem mal que não passasse.
Tinha o jovem doutor, tia, velha, teimosa e rabugenta, que sofria de graves males, que seriamente a atormentavam. Mas – apesar dos rogos, – recusava, peremptoriamente, ir ao médico.
Os familiares andavam deveras preocupadíssimos. Como demove-la da contumácia?
À Vila não queria ir. Também o médico, que ai clinicava, estava tão ancilosado, que mal conseguia diagnosticar a mais leve enfermidade.
Os desconfiados aldeões, preferiam as antigas mezinhas das avós, ou a arte mágica de bruxas da região. - Por sinal, poucas e ignorantes, e tão néscias como os rústicos campesino, - do que ir à Vila.
O que fazer, então?, já que a velhinha piorava a olhos vistos?
Após muito matutarem e altercarem, entre si, os parentes da velha casmurra, assentaram encetar a árdua e perigosa viagem, por vales e montes e caminhos escabrosos, até Bragança. Terra grande, onde havia hospital e vivia o sobrinho (?) da enferma, que granjeara reputação de “ sapiente”.
Mas como, se a velha não queria?! …
Nessa recuado tempo, não havia quem tivesse automóvel - nem na aldeia, nem, talvez, no concelho. - O remédio era transportá-la de burro – animal pachorrento e amigo de fazer vontades.
Mas como convencer a velha?; se não queria sair de casa?
Acordaram, por unanimidade, chamar dois valentões, que agarraram e amarraram a mulher, com grossas cordas, à albarda, coberta por velha e surrada liteira.
Bem segura e bem atada, lá foi a nossa velha, bracejando e chorando, até à Praça da Sé, e da Praça até, à porta do consultório do famoso médico, onde arreataram o jerico,
Estava o clínico, de estetoscópio na mão, a auscultar conscientemente o peito de respeitosa idosa, quando escuta grande alarido, que subia da rua. Algazarra infernal, chinfrinado endiabrado, à mistura de muitos guinchos, berros e vozearia.
“ O que seria?!” – Pensou, atónito, o jovem médico.
Esclareceu-lhe a curiosidade a solicita empregada, que entrou afogueada no consultório, explodindo num misto de surpresa e indignação:
- “ Senhor doutor: Está uma mulher, a gritar e a estrebuchar, amarrada a um burrico! …e muita gente à volta! … Dizem que é tia do Senhor doutor!!! …”
- “ Pois vá dizer: que não sei quem é. E mande-os embora…Não atendo ninguém que venha amarrado a um burro! …”
Não houve outro remédio, apesar dos rogos e altercações, senão regressarem à terra, com a velha amarrada, e mais séquito de festiva garotada, até ao Loreto, que em risos e chalaças, galhofavam com a grotesca e hilariante cena.
Mais tarde, parentes do jovem médico, diziam, entre si, e para quem os queria ouvir, com olhos de indignação cravados no céu:
_ “ Parece impossível! Ter vergonha da tia! … Sangue do seu sangue! …”
E os aldeões, que os ouviam, repetiam, com cibinho de ira, sacudindo negativamente a cabeça:
- “ Vão estudar para a cidade. Ficam ricos, e não querem saber dos pobres! … É para isso que uma mãe cria o filho! …”

Humberto Pinho da Silva, nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA.Foi redactor do jornal: “Notícias de Gaia"” e actualmente é o responsável pelo blogue luso-brasileiro: " PAZ".

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