Número total de visualizações do Blogue

Pesquisar neste blogue

Aderir a este Blogue

Sobre o Blogue

SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

MANDUCA;O MENINO QUE NUNCA CONHECEU O PAPAI NOEL

Por: Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS
São Paulo (Brasil)
(colaborador do Memórias...e outras coisas)

Lá, no alto do morro da favela, onde o vento faz a curva e encosta o lixo e onde o antigo riacho vira esgoto a céu aberto, o pobre Manduca aguarda a chegada do Papai Noel. Ele nunca havia visto o bom velhinho, no entanto ele queria acreditar que o bom velhinho existia. Ele se aplicou na escola e ajudou todas as pessoas que precisavam de sua ajuda; em que pese o corpo franzino, a pouca estatura para um menino de doze anos: ele queria muito ganhar um presente! 
A periferia, o lixo urbano, com seus barracos de madeira, papelão e lata e suas casas de blocos de cimento barato, sem reboco, refletia o pisca-pisca das estrelas distantes. Do alto do morro, Manduca contempla as luzes da cidade, lá em baixo, refletida nas águas do Oceano Atlântico. Lá, em meio daquelas luzes, ficava o hospital onde sua avó; a única pessoa que realmente importava, estava internada com pneumonia! Aquele seria o primeiro Natal do Manduca sozinho no barraco, sem sua avó. Sem sua avó, sem comida, sem dinheiro, sem amigos que se importasse com ele. 
De início ele tinha fé que a mãe do Tiziu, seu melhor amigo e vizinho, o convidasse para comer. Mas a avó já estava no hospital há uma semana e nunca lhe deram um prato de comida. Ele cozinhou as batatas que tinha em casa, inclusive aquelas com manchas de podridão e com brotos. Batatas cozidas em água e sal. Este era seu cardápio desde que a avó se fora, levada pela ambulância da prefeitura. O hospital era longe e Manduca só havia ido uma vez vê-la, a pé, pois não tinha dinheiro para os dois ônibus que deveria tomar. E foram quatro horas de caminhada na ida e mais quatro na volta que, aliás, não valeu muito a pena: a avó estava em coma e nem sabia que o neto estava ali ao seu lado, chorando e com a barriga roncando de fome... .
Mas o Manduca estava ali, firme e forte, aguardando o Papai Noel. Na sua cabeça de criança, ele imaginava o bom velhinho como um negro, com roupas africanas, coloridas, portando um saco de presentes. (O Manduca nunca havia entrado num Shopping Center, portanto ele desconhecia que todos os Papais Noel que se mostravam lá eram brancos; afinal originários da Lapônia, no Polo Norte).
As horas passavam. A barriga doía devido à falta de alimentação. A fé era grande. Quase meia-noite. Manduca lembra-se de rezar pela avó. Ele lembra-se também da mãe, porém ao se lembrar de que ela o abandonara quando tinha um mês de vida, fez com que uma lágrima saltasse de seus olhos.
Manduca enxuga as lágrimas com a manga da camisa desbotada. Está triste; talvez a esperança de encontrar o Papai Noel, começasse a se dissipar.
Ouve um zum-zum-zum logo abaixo da viela do morro. Vê uma pessoa correndo: era um negro, com capote vermelho, um saco às costas, que ao Manduca parecia cheio de brinquedos... .
-Papai Noel !!!!!!!!!!!!!, gritou o  Manduca.
Mas, em seguida viu duas pessoas correndo atrás do Papai Noel, cada m deles com uma arma de brinquedo na mão (quem sabe foram dar os brinquedos e não encontraram os meninos!!!, pensou). Manduca parou de chorar e abriu um sorriso ao Papai Noel, que passa por ele, dando-lhe um esbarrão. Manduca fica, mesmo assim, feliz e atarantado (ele esperava que o Papai Noel lhe desse algum presente). Mais abaixo, os dois que corriam atrás do bom velhinho dispararam suas armas. Uma bala perdida atingiu Manduca, próximo da orelha. Manduca sentiu uma dor terrível, queimando, queimando; e cai em meio à viela. Os dois perseguidores do Papai Noel, passam pelo corpo do menino, envolto à uma poça de sangue. O corpo franzino do menino estava frio; uma brisa fria soprou do mar para o morro naquele instante, fazendo eriçar os cabelos dos transeuntes... .
Não mais havia a avó no hospital, não mais havia o Papai Noel negro; não mais havia Manduca, nem brincadeiras com o Tiziu! Lá em baixo, na Zona Sul do Rio de Janeiro, os fogos espocavam, anunciando o Natal. No meio da viela da favela estava Manduca, sem alma - que já havia se desprendido!

Mais um anjo negro voou para o céu!

- Mais uma estrela passou a piscar no céu, naquela Noite de Natal!

Criado em: 24/12/2013

Antônio Carlos Affonso dos Santos
– ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 8 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de quatro outros publicados em antologias junto a outros escritores.

Sem comentários:

Enviar um comentário